Aos que virão!

Quer queiramos ou não, os mitos alimentam os nossos sonhos e justificam a nossa existência.
Este blog reverencia os mitos deste nosso Cariri Encantado.

terça-feira, 31 de maio de 2011

A divina conformação - Emerson Monteiro

Na Palestina, depois que Jesus fora executado e as coisas pareciam retornar à antiga normalidade, um dos seus apóstolos, o de nome João, não se aquietava, a procurar canto, qual dizem dos que lutam e nada conseguem para aceitar as situações difíceis.

Durante semanas, sua vida era só amargura, sofrimento por cima de sofrimento. A ferida aberta com a perda do Mestre parecia crescer cada dia um pouco mais. Aonde seguisse, levava consigo a saudade imensa da presença divina, fugindo-lhe do ânimo o gosto de pelejar, e ninguém conseguia consolá-lo. Tornara-se, por isso, a maior preocupação dos amigos e familiares.

Alguém lembrou, então, de Maria de Nazaré, a quem devesse procurar, na busca de palavras de conforto, pois se revelara exemplo perfeito de resignação face à inominável tragédia que também lhe vitimara.

Destarte, João viajou ao lugar em que morava a mãe de Jesus.

Numa demorada conversação dos dois, a santa mulher indicou a João que chegasse ao Mar da Galiléia, porquanto, nas suas margens, acharia motivo suficiente de recobrar forças e firmeza de tocar adiante a vida.

João aceitou o conselho e buscou as praias daquele mar, em que permaneceu algum tempo. Relembrava os passeios felizes de vezes anteriores, absorto nos transes da dor. Certa tarde, preso à beleza das águas azuis, se deixava inundar de gratas recordações, quando avistou, deslizando em sua direção, no fino espelho das ondas, o vulto magnânimo de Jesus.

Um perfume de incenso raro, nessa hora emanava pelo ar, idêntico ao que experimentara junto da cova em que depositaram o santo corpo do Mestre, nas proximidades de Jerusalém.

Perante o inesperado fragor, quis esmorecer sob o peso das emoções ali vividas. Fechou os olhos, na mais fervorosa contrição, e ouviu nos refolhos da alma lacerada, translúcido, o falar do Verbo de Deus:

– Estimado João, jamais queira imaginar que habito longínquas paragens afastadas de quem amo. Saiba, no entanto e sempre, que quando alguém chamar com sinceridade ao seu lado estarei, na eternidade dos verdadeiros sentimentos, contra qualquer obstáculo; pois não há distância entre os que se amam.

Dali em diante, tocado pelos eflúvios da revelação inesquecível, o apóstolo se rendeu ao abençoado reencontro e entregou-se ao poder da conformação, para realizar o trabalho evangélico que viera cumprir na Terra.

Programa Cariri Encantado Sonoridades - 01/06/2011

Conexões musicais: Quinteto Violado, a universalização do popular


Em 1971 surgiu em Pernambuco um grupo musical que traçava um novo caminho para a MPB. Diante da indecisão no cenário da música nacional, após a irrupção do movimento tropicalista, o Quinteto Violado apresentava uma proposta fundamentada nos elementos musicais da cultura regional, através de trabalhos de pesquisa e da própria vivência de cada um dos seus integrantes, originários da região Nordeste do Brasil.

Conseguindo extrair das mais simples manifestações populares a sua essência rítmica e melódica, o Grupo criou uma nova concepção musical, cujo traço fundamental é a interação entre o erudito e o popular, sem desfiguração, reafirmando a idéia de que toda arte é sempre a universalização do popular. Com excepcional criatividade e talento, o Quinteto Violado, em seu disco de estreia, talvez nem sequer imaginasse que, muito mais que uma nova roupagem orquestradora, estava produzindo a semente de uma mudança no modo de sentir e expressar a música brasileira.

O programa Cariri Encantado Sonoridades, em mais um especial temático, enfoca parte da extensa obra do Quinteto Violado – afinal já são 40 anos de trabalho registrados em livro, vídeo e mais de 47 discos lançados no Brasil e no exterior – com base em dois momentos marcantes de sua carreira: os discos “Quinteto Violado”, de 1973, e “Coisas que Lua canta”, de 1983. O repertório destaca versões bem construídas de músicas gravadas por Luiz Gonzaga, como Asa Branca (em duas versões definitivas), Acauã, Vozes da Seca, Boiadeiro e Juazeiro.

E como dizia José Nilton, quem viver, ouvirá!

Onde escutar
Rádio Educadora do Cariri AM 1020 e www.radioeducadoradocariri.com.

domingo, 29 de maio de 2011

O general Inverno - Emerson Monteiro



Assisti recentemente ao filme Guerra e Paz (1957), superprodução do diretor americano King Vidor, com Henry Fonda, Audrey Hepburn e Mel Ferrer, dentre outros destaques, que aos dez anos vira pela primeira vez no Cine Moderno, em Crato, bem cuidada e rica montagem cinematográfica do célebre romance de Leon Tolstói, obra imorredoura da literatura universal.

Aprendemos que bom é reler; e, no caso dos filmes, rever. Atualizar a leitura de peças antes conhecidas, quando, então, desaparecerá a ansiedade em conhecer o final, e se mergulhará na interpretação dos detalhes com visão mais ampla e apurada no tempo.

Depois disso, a trama romanceada nos personagens russos das guerras napoleônicas impõe sua força ao decorrer dos acontecimentos, mostrando capacidade extrema daquele povo de resistir aos desafios de sua história. A beleza exótica de Audrey Hepburn domina o papel de Natasha, personagem ingênua, contraponto ideal para mundos em conflito, a inocência original que nutre de ânimo os vencidos. Enquanto que o senso crítico de Pierre (Henry Fonda) conduzirá testemunho do contexto em queda livre diante do inesperado, formulando meios de superar o imperfeito.

Mas o que toca na essência do drama significaria a destruição das tropas francesas em retirada convulsa, vítimas da eficiência do general Inverno, com o que não laborou Napoleão Bonaparte no ímpeto das conquistas, vendo-se em condição de fragorosa decepção, ao furor das baixas temperaturas, da fome e da neve, dizimando preciosos efetivos. Esta lição Hitler não aprenderia, lá na frente, quando jogou os alemães a circunstâncias parecidas, no mesmo território, amargurando a maior derrota das campanhas nazistas aos custos, inclusive, de rendição humilhante na Segunda Grande Guerra, mérito do bem sucedido general Inverno.

Recordo, na fleuma dos soviéticos perante a dor, sua busca pela transformação socialista que propôs e que redundaria no fracasso de 70 anos de vivências do recente século. Com a fibra heróica da civilização milenar, o sonho justo e igualitário ver-se-ia por terra, face às humanas limitações em realizar a perfeição nos grupamentos comunitários. Eles, os russos, chegaram longe nesse projeto de transformação social, contudo haverá longo percurso pela frente até a concretização plena da solidariedade e da paz em termos coletivos, porquanto, no íntimo, o egoísmo ainda impera e detém a consciência das massas. Sem o aprimoramento real dos indivíduos jamais se chegará à verdadeira fraternidade neste chão, pois.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Hello !

Defronte do Copacabana Palace, no Rio, no domingo dia vinte e dois de maio, uma multidão olhava para a janela da suíte presidencial, quase a quebrar o pescoço, esperando pelo aparecimento, por um mínimo instante que fosse, do seu ídolo. A turba formava-se por muitas gerações : bisavôs, avôs, filhos, netos. Uma senhora, passando pelo calçadão, arrastando seu poodle estranhou aquela atitude. “Um bando de gente desse, olhando para cima, como bestas, esperando o quê? Outro besta aparecer lá em cima?” Um rapazinho de uns vinte e poucos anos, fita-a seriamente e diz:

--- Minha , senhora! O que é isso? Respeite a religião dos outros! Se a senhora soubesse que Jesus estava hospedado aqui, não estaria ajoelhada neste calçamento? Pois ali em cima se encontra meu deus! Respeite a minha religião!

Pertinho, um outro rapazinho conversa com amigos e informa que não vai dar mais para esperar. Tem que ir para o Engenhão, render alguns amigos que estão na fila e precisam almoçar. E diz: “Estamos acampados lá desde quarta-feira, queremos ficar pertinho de Paul!”. À noite, no estádio, uma fila quilométrica aguardava a abertura dos portões. Pessoas de todas as idades estavam prontas a suportar mais de nove horas em pé, deslumbradas e anestesiadas com possibilidade de, após a maratona, estarem pertos, num show inesquecível, de São Paul McCartney de Liverpool. Avós, filhos, netos, das mais variadas regiões do país – umas quatro gerações --- ali estavam firmes e fortes. Alguns já tendo feito igual peregrinação nos shows anteriores de São Paulo, Porto Alegre e Buenos Aires. À nossa frente, uma senhora testemunha dos dourados anos sessenta, nos disse ter comprado ingressos para vir ao show daquele domingo e da segunda-feira. Passadas as longas seis horas aguardando o ídolo, uma platéia aparentemente estafada simplesmente ressuscitou quando Sir Paul apareceu no palco, com sua banda competentíssima e, sem muitas pirotecnias, sustentou um inesquecível Show de três horas. É que todos, totalmente reconfortados, assistiam à sua frente um show não de Paul mas do “The Beatles”.

Em pleno Império do Efêmero , pus-me a pensar: o que dá a uma obra tintas de eternidade? Ali estavam quatro gerações comigo, não de apreciadores da Banda, mas de Beatlomaníacos! Como aquilo era possível, se a primeira e mais primal atitude dos jovens é jogar no lixo tudo o que a geração anterior apreciou? Em plena era do Forró de Plástico, do Breganejo, do Axé Insosso, onde o sucesso dura no máximo alguns dias e as bandas nascem e morrem numa velocidade estonteante, como explicar a perenidade e a blindagem dos Beatles?

Queóps construiu sua pirâmide dois milênios e meio antes de Cristo.O faraó ergueu sua tumba gigantesca esperando ali ficar aguardando a ressurreição, ou seja moveu-o a busca da imortalidade. No fundo, toda obra de arte é uma nova pirâmide feita pelo artista, na quase sempre inglória tentativa de com ela driblar a morte e o esquecimento.A possibilidade quase que única de sobrevivermos de alguma maneira ao desaparecimento físico inexorável. A música que se faz hoje, quase sempre, na sua volatilidade, nada tem de ritualística e nem pode pretender ser arrolada como Arte. São casas de adobe, sem alicerce, para o pouso temporário e incerto de alguns. Feitas para o entretenimento daquele instante, daquele momento específico, rui como por encanto à primeira neblina. Sequer os bordões permanecem: “minha eguinha pocotó”, “minha mulher não deixa não”, “Ah, eu tô maluco!”

As tintas da eternidade são perseguidas por todos os artistas e, no fundo, é o moto-contínuo do seu fazer artístico. Mas não basta querer a permanência simplesmente. Nem mesmo a qualidade inequívoca da obra reconhecida hoje lhe dá, a certeza da permanência. Alexandre Dumas foi o mais reconhecido escritor da sua geração, assim como Anatole France e, nem por isso, a vivacidade das suas obras resistiram totalmente ao impacto do tempo. Balzac e Baudelaire, bem menos incensados enquanto viveram, criaram uma vitalidade impressionante com o passar dos anos. Além da qualidade temporal imprescindível da obra de arte, essa necessita de alguns outros atributos para as banharem de eternidade. Faz-se mister genialidade. O grande artista é sempre um visionário e consegue imprimir um profundo ar de atemporalidade naquilo que faz. Tantas e tantas vezes passa totalmente despercebido por seus contemporâneos, simplesmente porque pinta na tela do hoje utilizando as tintas do futuro.

Se a impermanência é o atributo mais palpável do reino animal, rescendeu um ar de eternidade , de divino quando Paul subiu ao palco do Engenhão no domingo. Como se todos estivessem diante da pirâmide e de lá saísse um Queóps redivivo dizendo Hello! e nunca, nunca mais, Good Bye!

J. Flávio Vieira

Falar em nome das matas - Emerson Monteiro


O projeto agora anda da Câmara para o Senado, mais para espantalho do que para código florestal. Espécie de lei remendo a tudo que se perpetrou até agora nas matas brasileiras, no afã dessa febre dos industriais no campo, a agroindústria exportadora, e da produção de carne para o mercado externo, a toque de caixa. Mundo desigual de tanta fome e tanto estrago. Os vegetais não têm deputados, senadores, advogados. Têm os donos das terras que tomaram dos índios, que receberam de herança, que compraram ao preço de banana, que desmatam e fica por isso mesmo, nessa ganância de ouro fácil. Defender o que, senhor parlamentar? As furnas das onças, os buracos dos tatus, as camas das pacas? Argumentar com o quê, senhor parlamentar? Com as cantigas dos matutos abilolados na faina de puxar cobra para os pés, e apurar quase nada ao final dos invernos? Ouvir o canto dos pássaros para quê, senhores, quando as parafernálias eletrônicas ecoam de norte a sul do País, nos forrós melados desse universo troncho da ressaca nacional, frutos negros da cultura de massa? Sim, o som estridente das motosserras e dos tratores do progresso invadindo tudo que pareça verde e que, vendido a troco de muambas, virá festa, nos salões amarelados das cidades de trastes engarrafados e brilhosos. Os gritos dos capitães da grilagem, caçadores com a espingardas dos outros. Grande farra coletiva, nesses tempos de pouca solidariedade e muito lucro. Há um protesto congelado nos ares da política pragmática e mercantil. Há dores caladas nos cantos escondidos das florestas esturricadas, abandonadas à própria ganância. Ninguém pode além de nada, nos tristes trópicos acelerados para que as florestas permaneçam nacionais, invés da dominação do Império avassalador. Quem contará essa história da entrega da alma cativa aos inúteis da fragilidade, aos apáticos e indiferentes? Quantas perguntas lançadas ao vento, nas manhãs melancólicas dos finais de natureza. Apenas reservos de poucas plantas restarão emolduradas aos quintais dos ricos, enquanto na praça da apoteose crescem os pretendentes aos postos de comando e erários públicos órfãos da cidadania.
Isto porque vejo pouca chance para as leis conscientes e que contemplem a realidade verdadeira dessa humanidade insana. O Brasil, nação estratégica dos novos tempos, quando acordará a isso, sem procurar conciliar os ânimos destrutivistas do que resta de patrimônio nativo?
A propósito, minha homenagem ao casal José Cláudio Ribeiro da Silva e sua mulher Maria do Espírito Santo da Silva, mortos a tiros na madrugada desta terça-feira (24 de maio de 2011) na área rural do município de Nova Ipixuna, sul do Pará. Eles só lutaram com autenticidade em nome da conservação da natureza!

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Intercessão valiosa - Emerson Monteiro

Das inúmeras ocorrências verificadas no decurso da Confederação do Equador, no Ceará, idos de 1824, episódio impressionante ficou registrado por Esperidião de Queiroz Lima, no livro Tempos Heróicos, que narramos aos que ainda não leram a referida publicação.
Trata-se da execução de um dos sentenciados pelo tribunal militar conhecido por Comissão Matuta, no mês de outubro daquele ano, instalado para punir as hostes rebeldes. Depois de julgados e condenados, cinco líderes republicanos seriam fuzilados no pátio da Cadeia Pública de Icó. Um desses, Antônio de Oliveira Pluma, autodenominado Pau Brasil, conforme sua assinatura no manifesto do movimento, insatisfeito com o resultado a que se via submetido, reagiu em altos brados, protestando misericórdia de quem ali se achava.
Recusara mesmo permanecer de pé, mas, sendo assim, forçaram-no em cordas a se sentar numa cadeira, onde, com olhos vendados, ainda pedia que o deixassem viver.
De nada lhe valeram as rogativas, pois logo em seguida o pelotão recebeu a ordem de preparação:
- Apontar!
E, ante os disparos iminentes, o pânico pareceu querer tomar a alma do condenado em face da morte inevitável, sob o monto de todo o idealismo que até ali dominara os atos de sua razão da existência. Outra vez, um gesto cresceu de sua voz, explodindo mais alto em reclamações de amparo, lançadas aos planos superiores:
- Valei-me, Senhor do Bonfim!
Nisto foi secundado pelo toque de comando: - Fogo!
Cessada a fumaceira, as balas achavam-se cravadas no muro onde o revolucionário permanecera incólume, sacudindo de espanto os presentes. Seguiu-se nova carga de munição. Restabeleceu-se a ordem preparatória, e se fez no ar outro grito de socorro:
- Valei-me, Senhor do Bonfim!
- Fogo! - foi a ordem marcial.
Resultado: o alvo manteve-se intacto. Os tiros voltaram a ferir tão só e apenas o muro, para desânimo da escolta. Em meio do inesperado, tonto, pálido, o comandante reclamava prática melhor de tiro a seus homens, visando manter os praças no cumprimento do dever, tratando de retomar as determinações da próxima tentativa, que foi precedida pelo mesmo grito do condenado, tão pungente quando sincero:
- Valei-me, Senhor do Bonfim!
Os disparos se deram, de acordo com a obediência. Desta vez Pluma fora atingido por algumas balas, mas continuava vivo, segundo narra em seu livro Queiroz Lima.
Os soldados de pronto se movimentavam para um quarto fogo. Nesse instante, a população presente, tocada de simpatia pelo confederado, se ergueu coesa e exigiu o direito do réu ser libertado, qual merecesse o valimento dos céus. Em seguida, essas pessoas levaram-no consigo, alheado e preso à cadeira do martírio, até à Igreja do Senhor do Bonfim, distante cerca de 200m do ponto onde a cena ocorrera, entre preces e benditos fervorosos.
Há registros do ano de 184l que dão conta de que o sobrevivente veio a ser titular da Promotoria Pública da comarca de Baturité, no Ceará, o que bem comprova sua resistência aos ferimentos naquele dia recebidos, na tentativa de execução de que fora objeto e sobrevivera, no município de Icó, 17 anos passados.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Programa Cariri Encantado Sonoridades - 25/05/2011

Conexões musicais: Fagner, até fracassos lhe são sucessos


Raimundo Fagner Cândido Lopes, mais jovem dos cinco filhos de José Fares, imigrante libanês, e Dona Francisca, nasceu na capital cearense, embora tenha sido registrado no município de Orós, localizado na região centro-sul do estado.

Raimundo Fagner é reconhecido hoje como um dos cantores e compositores nordestinos que mais conseguiram emplacar sucessos na programação radiofônica e televisiva de Música Popular Brasileira, desde meados dos anos 1970 para cá.

O programa Cariri Encantado Sonoridades apresenta um especial com Raimundo Fagner a partir de dois discos que são referenciais de sua carreira: Ave Noturna, de 1975, e Eu Canto, de 1978.

Nesses discos despontam grandes composições do cantor e compositor cearense, ou por ele interpretadas, algumas delas verdadeiros hinos da época que caíram no gosto do povo: Fracassos, A Palo Seco, Riacho do Navio, Revelação, Jura Secreta e As Rosas não Falam.

Onde escutar
Rádio Educadora do Cariri AM 1020 e www.radioeducadoradocariri.com.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Programa Cariri Encantado Sonoridades - 18/05/2011

Conexões musicais: Tom Zé, em tom maior


Tom Zé, batizado com o nome de Antonio José Santana Martins, é compositor, cantor, performer, arranjador, escritor e jardineiro (isso mesmo), nascido em Irará, Bahia, em 11 de outubro de 1936, em uma família de classe média. É considerado uma das figuras mais originais da música popular brasileira, tendo participado ativamente do movimento musical conhecido como Tropicália nos anos 1960 e se tornado uma voz alternativa influente no cenário musical do Brasil. A partir da década de 1990 também passou a gozar de notoriedade internacional, especialmente devido à intervenção do músico norte-americano David Byrne, que o lançou naquele importante mercado artístico-musical.

O programa Cariri Encantado, em boa hora, homenageia esta grande personagem da cultura brasileira, através de uma seleção com seus principais sucessos que constam principalmente do seu segundo disco solo Tom Zé (1970).

Onde escutar
Rádio Educadora do Cariri AM 1020 e www.radioeducadoradocariri.com.

domingo, 15 de maio de 2011

Uns animais eletrônicos - Emerson Monteiro


Bem ali detrás há poucos instantes de meros segundos, essenciais, no entanto, fora tomado daquela mesma sensação esquisita que agora volta a se repetir, a querer, todo custo, se projetar, sair pela ponta dos dedos, na emoção frívola de palavras vivas, indo diretas desde a corrente sanguínea ao papel, esguicho contínuo de uma sensação solitária, a formar definições e falas, bichos vivos, fugitivos. Na mão, fechado, quente, o pulsar heróico do coração do bicho feito pequeno pássaro animado, impaciente, aqui prisioneiro, no meio dos dedos e da palma, à pressão relativa sobre o celular que o retém preenchendo esse âmbito dos sentidos, já dominando a força aquecida no bloco inteiro das percepções vitais da pessoa instalada no comando central dos acontecimentos.
Nisso, a energia sincopa em toda casa. Dá um, dois picos intermitentes, saltos de dentro da madrugada para o dia surgindo nas luzes do nascente, que sorrateiras penetravam pelos quadrados de vidro laterais da porta, como quem quer rever os escuros da noite na sombra que começava, lentamente, a despertar para as novas claridades. Foram eles, os dois pulos de intensidade na energia, e todos receberam o jato de paralisação das funções, sinais suspensos na sobrevivência do ser gente e máquina em que humanos se transformaram.
Aquele espectro sideral de moléculas atadas à condição material na força das circunstâncias obtusas do firmamento, presas no alto do espaço, apenas estagnara em forma de protagonistas vazios da ausência de movimento aparente. Por dentro, no entanto, espasmo cataléptico misturava o sabor do tremer do telefone preso na mão, pássaro contido nas dobras das falanges ao longo do corpo da máquina comprimida.
Imagem paralisada no alvorecer que cessara de vez no cessar da energia da rede silenciada, a virar borrão afixado na inércia que deslizava durante o rio das coisas, sem conter mais no bojo de si o elemento estarrecido em pleno voo, nesse abismo que divide escuro e de iluminação. Parado ficara, permanecera, cartaz preso às margens da longa estrada do tempo.
Lá adiante nas horas, contudo, ainda que avisado durante algumas chamadas perdidas, pelo mecanismo estreitado nos dedos e na palma, acordaria atônito, aos sopapos secos da geladeira refeita no retorno da corrente aos músculos. Isso horas depois, Sol alto no céu, antes do pino do meio-dia, fora das cogitações possíveis e quase vítima do desespero, ouvindo o estalo das coisas descongelando abafadas no interior da fria composição.
Esfregava os olhos quando adquiriu a oportunidade para ativar, outra vez, os mecanismos do domingo junto aos sistemas externos, porém fundamentais à existência dos humanos, dependentes vorazes da corrente elétrica. Agradecido, contudo, estendeu a mão e depôs sobre a mesa o pássaro impaciente, a única via de contato real quando perdera os impulsos do mundo, naquela crise de abstinência temporária dos multimeios.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Amor na prateleira


Eita geraçãozinha sofrida esta dos anos 60! Não foi brincadeira não, meus amigos! Maio de 68, o movimento Hippye , Woodstock, enfrentamento da ditadura militar. Vá lá que conseguimos usufruir de alguns frutos semeados: a liberdade ainda que tardia depois de Figueiredo e uma rebarbazinha de liberdade depois da pílula. A maior parte da colheita, no entanto, caiu no paiol dos nossos filhos e netos. Assim se faz a vida: plantamos a semente no nosso quintal e a melancia brota no do vizinho. Cá me ponho a matutar com meu zíper, por que diabos não alcançamos as delícias do “fica”; o namoro no motel e não na praça; o final de semana no hotel com a paquera; o desbancamento definitivo da virgindade; a noite que acaba ao amanhecer e não às 21 horas; a iniciação com a namorada e não com a rameira.Claro que, por outro lado, não tínhamos alguns acidentes de percurso como a AIDS, mas , definitivamente, entre prós e contras, perdemos de goleada. Percebo que conversar com os amigos no Orkut, não é a mesma coisa que tê-los junto, numa mesa de bar. Entendo também que, em busca do fruto proibido, os namoros antigos carregavam consigo uma carga de sensualidade incrível: a do desejo impossível de ser saciado. Há grandes possibilidades de que o doce de leite não provado venha a tornar-se eternamente delicioso, mas não substituí, a meu ver, o prazer único de degustá-lo, mesmo com o risco de , com o passar dos dias, transformar-se num doce qualquer , comum e trivial, mesmo tendo saído das mãos de Isabel Virgínia.

Preocupa-me, por outro lado, a transformação gradual do amor num mero bem de consumo. O namoro e o casamento cobriram-se de um forte tom utilitarista.Não muito diferente do que se criticava nas gerações passadas: casamentos escolhidos pelos pais , sem nenhum vínculo amoroso entre o casal. Mudamos? Hoje, procedem-se, novamente, a todos os preparativos da viagem, calculando os mínimos detalhes. Muitas vezes se utiliza mais a contabilidade que o coração. São tantos os critérios a serem preenchidos pelos pretendentes que a cidades se vão inundando de legiões de solitários: com seus rituais, seus temores e suas idiossincrasias.Todos querem segurança e estabilidade, numa viagem onde a beleza e eternidade estão escondidas justamente no instável e no fugaz.As agências de casamentos oferecem parceiros com os ingredientes de uma receita de bolo e escolhem-se companheiros como se cata presentes para um chá de cozinha. Nem se percebe que o encontro de duas pessoas é sempre a fusão de dois abismos perfeitamente insondáveis.

Semana passada li uma notícia que mais que nunca condensa os tempos atuais. Abriram, no Japão -- pasmem vocês-- uma agência para desfazer casamentos. Funciona de maneira muito simples. Um dos parceiros quer finalizar o relacionamento de modo rápido? Contrata a agência e esta manda um funcionário(a) seduzir o marido ou a esposa. Filma-se e documenta-se toda a tramóia e, aí, entrega-se o dossiê ao interessado que,em rito sumário, procede à separação. Segundo a agência , conseguem índices favoráveis em até 90% das contratações.A competência dissolutiva dos funcionários da empresa é testada a todo momento, se não conseguirem desencadear os escândalos necessários acabam demitidos rapidamente. Ou seja , amigos, já temos, no mercado, fábricas de construir e destruir relacionamentos. O amor e o desamor estão estampados na prateleira à espera de qualquer cliente. O dinheiro, como já previra Nélson Rodrigues, compra tudo, até mesmo amor sincero.

Neste ponto, o mundo ficou mais chato. Desapareceram o mistério, a surpresa, a arte do encontro e do desencontro. A sexualidade engoliu a sensualidade. O olhar, o beijo, a palavra, o toque tornaram-se obsoletos. As pessoas , embora mais livres e menos preconceituosas, vão se tornando mais individualistas. A tolerância , artigo de premente necessidade neste mundo de guerras e conflitos, deveria fluir naturalmente do relacionamento cotidiano entre os indivíduos. Mas os homens estão ocupados demais preenchendo fichas e planilhas e não conseguem perceber os outros passageiros que, na mesma nave, empreendem a fantástica viagem que chamamos vida.

J. Flávio Vieira

terça-feira, 10 de maio de 2011

Efeito agregador - Emerson Monteiro

Noto que as ideias formam blocos parecidos com a evaporação que forma as nuvens no céu. À medida que essa formação das ideias ganha densidade, tende a produzir palavras e ações. Quais as nuvens carregadas de água da evaporação, as ideias também resultam em resultados novos. As nuvens, na chuva. As ideias, nas palavras e atitudes. Quando chovem, as nuvens perdem suas características iniciais e, já na terra, criam os córregos, rios, reservatórios e mares. As ideias, colhidas pelos que ouvem e leem, geram outras ideias, ações, e seus frutos. No andar de tal raciocínio, lembrei dos versos de Castro Alves, no poema “O livro e a América”, quando dizer: “O livro caindo n'alma / É germe - que faz a palma, / É chuva -- que faz o mar”.
Veja só aonde vou chegar neste raciocínio de agregação das águas em nuvens e das ideias em palavras e praticados. Derivo a considerar o efeito multiplicador da moeda, que antes era só uma ideia, hoje assunto técnico de economia, e aspecto importante das transações sociais. A moeda que gira, e o mundo gira com ela. Lá nos primórdios, quando ela ainda não existia, se dava o contrário, o mundo apenas girava, e a moeda dormia no celeiro inocente das ideais.
Nasceu o dinheiro, inventado, ou descoberto fruto da necessidade das pessoas, ocasionando todo movimento conhecido de portos e navegações, indústrias e mercados. Indústria, comércio, serviços. Patrões e operários.
O dinheiro existe para ser utilizado. Dinheiro guardado representaria água retida, sujeita à estagnação. A poupança pública, tão decantada no tempo do presente, por exemplo, trabalha em mãos dos bruxos financeiros, a fim de gerar a riqueza dos povos e das nações.
Essa moeda, que pode ser de papel, de metal ou, apenas, de números escriturados nas contas das instituições, circula e multiplica a riqueza que representa. Este o denominado “efeito multiplicador da moeda escritural”, estudado nas academias, quando pagamentos e recebimentos passam a acontecer por meio da multiplicação do uso do dinheiro e representa o maior volume da riqueza em circulação nos mercados mundiais.
Bom, cheguei enfim ao instante contar do que me trouxe nesse encaminhamento.
Isso, de falar na lei de acumulação de águas, ideias e moedas, em que funcionam os barcos da coletividade. Ainda que, por vezes, achemos que há dinheiro escuso, mal ganho, sujo, capital não tem pátria, nem mortalha tem bolso, na voz da experiência. Enquanto corrompidos costumes políticos, morais, econômicos, financeiros, ainda assim a riqueza segue seu curso na história e a vida continua. Visto que leis maiores a tudo isso regem, dentro da mais sábia das ordens universais de todos os acontecimentos, aqui nos achamos, sim, no firme propósito de salvar as nossas consciências.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Programa Cariri Encantado Sonoridades - 11/05/2011

Conexões musicais: A Cor do Som e o som da cor

A Cor do Som foi um dos mais importantes conjuntos musicais brasileiros de todos os tempos. Formado no Rio de janeiro, no ano de 1977, pelos irmãos Maurício Magalhães, o Mu, tecladista, e Dadi, contrabaixista, que já tinha integrado a lendária banda Os Novos Bahianos, - A Cor do Som contava com o virtuoso guitarrista Armadinho, filho de Osmar Macedo, fundador do pioneiro trio elétrico carnavalesco Dodô & Osmar; além de uma “cozinha” rítmica das mais competentes, formada pelo baterista Gustavo e o percussionista Ary.

O programa Cariri Encantado Sonoridades traz uma seleção de 11 músicas da banda, que constam dos discos Frutificar, de 1979, e Transe Total, de 1980. São composições refinadas e algumas delas foram sucessos radiofônicos e comerciais, como Abri a porta, de Gilberto Gil e Dominguinhos; Beleza pura, de Caetano Veloso, Palco, de Gilberto Gil, Zanzibar, de Armadinho e Fausto Nilo) e Semente de amor, de Mu e Moraes Moreira.

Onde escutar
Rádio Educadora do Cariri AM 1020 e www.radioeducadoradocariri.com

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Um monstro devastador - Emerson Monteiro

Outra vez falar das drogas, da fera que tomou para refém a sociedade, inoculando seu veneno sobre a doce flor da melhor juventude dos nossos tempos. Recentes notícias falam de um filme documentário na fase de conclusão denominado “Quebrando o tabu”, do cineasta brasileiro Fernando Grostein Andrade, que trata do assunto de modo a repensar aquilo o que Estado pode oferecer como alternativas para o fracasso na guerra às drogas.
Numa sequência de entrevistas com personalidades importantes; políticos, intelectuais e cientistas; Bill Clinton, Jimmy Carter, Dráuzio Varella, Gael Garcia Bernal, Paulo Coelho, etc.; esse trabalho quer indicar maneiras novas de abordar o grave problema, considerado muito mais uma questão de saúde pública do que, apenas, fator e origem da criminalidade. A dependência das drogas ocasiona males inimagináveis à família e à sociedade, deixando cicatrizes profundas na história, desde as remotas eras.
O maior perigo das substâncias estupefacientes é que prendem pelo prazer físico imediato, motivando a ânsia da repetição e estabelecendo a sujeição química dos seus usuários.
No filme, no meio de outros depoimentos, o ex-presidente norte-americano Bill Clinton declara haver conhecido as drogas através da dependência de um seu irmão que se tornara dependente de cocaína, levando-o saber, na própria pele, os males da trágica matéria.
Flagelo avassalador, as drogas chegam inclusive às penitenciárias de segurança máxima, conforme analisa um dos entrevistados. Indiscriminadamente, vitimam todas as classes sociais, todas as idades, todos os países, raças e credos. Ninguém se dirá livre da infelicidade das drogas, que aparecem na gênese dos piores delitos e maldades humanas.
No filme, também o escritor Paulo Coelho observa os riscos a que incorrem pessoas quando assumem o ônus de conhecer as drogas, a partir de quando nada mais poderão decidir com liberdade. Uma viagem sinistra, as drogas impõem condições irreversíveis, da doença à morte, no confronto de situações extremas e destruidoras.
A fatalidade das perversas substâncias rasga os olhos desta civilização, limitando as providências dos governos, que ainda ignoram as proporções reais do terrível inimigo em termos de consequências atuais e futuras. Deste modo, sombras de medo percorrem ruas e palácios, numa escalada jamais vista admitida em tempo algum.
A ciência e os órgãos de segurança, só por si, enfrentam a crise na esperança dos meios ideais de, pelo menos, reduzir o prejuízo comum, enquanto a responsabilidade do problema pesa nas costas de gregos e troianos, pais, irmãos, filhos, amigos e desconhecidos, numa luta surda para conter os números da triste servidão.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Tradições & Traduções


“O fim da arte inferior é agradar,

o fim da arte média é elevar,

o fim da arte superior é libertar”

Fernando Pessoa

O Centro Cultural Banco do Nordeste, no seu aniversário de cinco anos, tem muitas razões para comemorar o apagar das velinhas e o talho do bolo. O Centro trouxe a força gravitacional necessária para atrair as mais diversas formas de arte e a caixa amplificadora para dar ressonância às mais diversas expressões artísticas de que o Cariri é reconhecidamente um celeiro. O Centro Cultural somou suas forças ao trabalho já encetado há muitos anos pelo SESC e hoje é possível dizer que a os rumos da Cultura aqui na nossa região dividem-se em aC e dC ( antes e depois do Centro).

No último dia 29 de Abril, subiu ao palco, num memorável show de aniversário, uma plêiade de artistas representativos daquilo que se vem fazendo de melhor em música contemporânea no Ceará. De um lado a TRADIÇÃO configurada na batida inconfundível e telúrica dos “Zabumbeiros Cariris”, com seu canto úmido de misticismo , grávido de húmus. O canto que teve a participação especial de Luciano Bryner e que nos aviva na alma nossas profundas raízes pernambucanas que saltam do Maracatu de Baque Virado, dos Caboclinhos, do Coco de Praia.Na outra extremidade os músicos caririenses mais representativos, no seu trabalho autoral, e que digeriram toda nossa cultura popular mas temperada com as mais diversas influências da música/poesia universais . Trazendo-nos o contraponto imprescindível das “TRADUÇÕES”. Todos eles , incrivelmente, com mais de quarenta anos de estrada, mas provando-nos ,a todo instante do Show, que a boa arte é libertária e atemporal.

Abidoral Jamacaru , Luiz Carlos Salatiel, João do Crato esmeraram-se em trazer à ribalta o que existe de mais clássico no repertório da música caririense: “Lua de Oslo”, Prá ninar o Cariri”, “Lá de Dentro”, “Limite”, “Oriente”, “Vida”, “Cuba”, “Coco pra Azuleika e Asa Branca” e tantas outras. A poesia icônica de Geraldo Urano brilhou como se saísse dos refletores, junto com um universo de compositores cearenses: Pachelly Jamacaru, Ermano Morais, Eugênio Leandro, Amélia Coelho, Cleivan Paiva, Luiz Gonzaga... A banda trazia a competentíssima batuta de Ibbertson Nobre nos teclados /Sanfona, Rodrigo(Bateria) , a percussiva presença dos Zabumbeiros, além dos inconfundíveis baixo/violão de João Neto.

A casa estava cheia de uma platéia entusiasmada e participativa e que em voz uníssona confirmava: Um Show para se ver e rever! Um show que precisa sair do casulo e ganhar os palcos do Ceará e do Brasil !

Esta é a nossa Arte: a expressão maior de que aqui estamos vívidos e vivos. Mídia do Brasil, nem só Traições vive o Show Business! Que tal Tradições & Traduções ?

J. Flávio Vieira