Aos que virão!

Quer queiramos ou não, os mitos alimentam os nossos sonhos e justificam a nossa existência.
Este blog reverencia os mitos deste nosso Cariri Encantado.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Claro-escuro

Recostado numa preguiçosa, abaixo de uma velha jaqueira, o velho Sinfrônio Arnaud contemplava os canaviais do Cotovelo, com vista privilegiada. Um sol já meio bemol, de quatro da tarde, parece envernizar as folhas das canas que brilham e tremeluzem tangidas por um renitente vento de agosto. Arnaud punha-se a pensar nos destinos de Matozinho que vira crescer quase que de dentro da sua fazenda e hoje, varadas mais de oito décadas, empinava o umbigo e criava ares de gente lorde. Certo que ,como todo novo rico, ainda mesclava costumes matutos com atitudes grã-finas: a meio caminho entre a buchada e o caviar. Uma conversa, pela manhã, com um político neófito da vila, o pôs a matutar sobre o tempo que tudo vai engolindo com sua bocarra de Jaraguá. As verdades monolíticas de ontem dissolvem-se ,como por encanto, sob a ação inexorável das horas e do amálgama gelatinoso resultante esculpem-se novos costumes, novos paradigmas aparentemente sólidos e indissolúveis.
Metido tantos anos na política da cidade, construíra quase que uma nova constituição de leis populares, de limites e fronteiras intransponíveis nas campanhas eleitorais. Naqueles idos -- lembra-se com um sorriso mal disfarçado, nosso Sinfrônio – político não roubava. Primeiro, porque não havia sequer dinheiro em caixa: as verbas da prefeitura dependiam da arrecadação municipal de impostos cobrados a pessoas paupérrimas, a comerciantes pequenos. Tantas e tantas vezes precisou tirar do próprio bolso para cobrir as obrigações de final de mês. A palavra “ladrão”, assim, era termo proibitivo em qualquer circunstância e redundava, inevitavelmente, em faca no vazio , tapa no pé-do-ouvido, tiro de papo amarelo nos peitos do insultador. Qualquer alusão, também, a possíveis desvios sexuais padrões de candidatos ou parentes destes, resolvia-se nos campos de batalha e não nos tribunais. Sinfrônio mesmo comentava, com orgulho , que sua terra não possuía veados e nem mulher metida a homem : “ isso é putaria da capital e de Bertioga” , costumava dizer. Permitiam-se, apenas, fofocas atinentes a teúdas & manteúdas, mijos fora do caco , gambiarras dos candidatos do sexo masculino, até porque isso, se não acrescia, também não tirava voto de ninguém. O adultério masculino via-se como uma atividade normal e comum, já o feminino tinha leis específicas não muito diferentes das islâmicas.
Debaixo da jaqueira, Arnaud pensava na conversa que tivera pela manhã com Seginaldo Trancoso, um vereador em ascensão em Matozinho e só então percebeu como, definitivamente, aqueles bons tempos tinham sido mastigados pela engolideira do tempo. Trancoso contou que resolvera se candidatar pela primeira vez a vereador e, pouco conhecido, ninguém botou fé na sua candidatura. Tinha apenas uma bodeguinha na Vila e muitos conhecidos. De maneiras que ele, correndo nas laterais do campo, sem que ninguém percebesse bem, terminou sendo eleito. No pleito seguinte, no entanto, os adversários, já acordados, caíram de pau. Espalharam logo a notícia que ele era veado. A princípio Seginaldo disse ter ficado um pouco chateado, mas sustentou o dedo no apito: estava na chuva era prá se molhar. Pois, segundo ele, o tiro saiu pela culatra, aconteceu que perseguido, virou vítima , as florzinhas da cidade votaram todas nele que terminou como um dos mais bem votados na cidade. No último pleito, relatou Seginaldo, candidatei-me novamente e , aí, eles mudaram a tática: espalharam a fofoca que eu era corno. Aguentei calado novamente, embora sob protestos da minha santa esposa . Pois bem, desta vez é que a vitória foi arrasadora: todos os cornos de Matozinho votaram em mim e terminei como o mais votado e ainda presidente da Câmara. Na próxima eleição -- falou com franqueza Seginaldo para Sinfrônio -- estou achando que vão espalhar por aí que sou ladrão, pois é , vou sair logo candidato a Senador, não vai ter urna para suportar tanto voto !
No horizonte, Sinfrônio observou o sol desaparecer pro trás dos morros da Serra da Jurumenha . A noite invadia de sombra o Cotovelo. O mundo e a vida fluíam em meio à luz e a treva, num jogo eterno de claro-escuro.

J. Flávio Vieira

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O voto limpo - Emerson Monteiro

Diante das intransponíveis dificuldades para validar a lei da Ficha Limpa, só resta agora aos eleitores a responsabilidade direta pelo assunto e cuidar de limpar todas as impurezas do seu precioso voto já nas eleições do corrente ano.
Os pressupostos da chamada Ficha Limpa mexeram com previsões de antecipar em um ano a matéria de cunho eleitoral, gerando questionamentos desde os tribunais regionais até chegar ao Supremo.
Por essas e outras razões, porém, o escore apertado de 5 a 5, na votação dos ministros, bem demonstra o quanto custa reverter hábitos numa política dominada por caciques tradicionais aferrados ao comando.
Quando as forças em jogo dispuserem de energia suficiente para reformar as instituições políticas envelhecidas, só então haverá esperança de evoluir no voto com as mudanças para realizar o sonho da verdadeira democracia.
Enquanto não ocorrer, no entanto, caberá, mais do que nunca, aos eleitores escolher os candidatos dignos, bem preparados, honestos e trabalhadores.
Instrumentos básicos dos destinos nacionais, eles irão definir o futuro, nos vários setores da vida pública. Os escolhidos mandarão chuva durante quatro longos anos da paciência do povo. Chegarão ao trono cobertos das grandes oportunidades e dos maiores direitos. Achar-se-ão investidos na autoridade com imunidades, foros especiais e proventos generosos, à custa de uma nação pobre e cofres esvaziados.
Em qualquer outra situação, o mais modesto do eleitor estudaria com rigor, mediria, pesaria, examinaria, avaliaria como gosto suas preferências. No comércio, nas compras dos mercados, butiques, nos sacolões e freiras, restaurantes, bancas de revistas, locadoras, etc.
Nas cabines eleitorais, todavia, a situação ganha conotação de quem quer elevar alguém ao sétimo céu da política, ofertar cheques em branco, depositar noutras mãos valores morais e bons costumes, família, segurança, educação, alimentação, e muito mais.
Por isso, trate de exercitar a seleção dos seus candidatos com a vista descoberta, olhos de bom senso, no fiel cumprimento do dever e das leis da consciência, no justo do possível. Porquanto, seremos responsabilizados pelo bom andamento dos negócios democráticos conquistados ao preço das lutas heróicas das gerações que nos antecederam e nos confiaram à continuação dessa história de imensos valores positivos.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Motivos para ser feliz - Emerson Monteiro

Alguns dias, coisas deixam de acontecer do jeito que pretendíamos vê-las junto de nós. Nessas horas balançadas, espécie de peso desnecessário além até das proporções de costume, pressiona os nossos ombros, feito impacto nos sentimentos, a mexer nas fibras internas, querendo nos tirar do sério e quase que invadindo o caminho normal do barco.
Ficamos por ali, desconfiados, assim meio contrariados diante dos acontecimentos, vendo um tanto mais de cores cinza forte no mundo meio cinza fraco do lado de fora, entre movimentos de máquinas e da barulheira tradicional com quem já nos acostumávamos, no espaço da cidade.
Alguma descalibragem na direção, talvez fruto do desgaste das estradas. Todavia a fase com certeza passará, na dependência ao modo como encaramos aborrecimentos e pelejas de outras ocasiões.
Às vezes isso nasce dos desencontros de opinião no meio das pessoas, porém ninguém deve homenagem a ninguém, nos confrontos dessa vida. Outras vezes, caprichos desatendidos, os calores mais intensos dos finais do ano, as notícias contraditórias, esperanças perdidas, multidão de apreensões quanto ao futuro, etc. E paramos enquanto é tempo de parar.
Hora de ver em volta. Analisar o panorama geral dos hemisférios e decidir pelo melhor. Olhar com atenção quanto de valores positivos demanda em nossa volta para a formação das respostas aos desafios, que nada mais seriam do que as lições necessárias ao bom andamento do aprendizado nesta escola.
Ficar triste coisa nenhuma, afundar no desencanto nenhum sentido valerá.
E os milagres do cotidiano, as maravilhas que merecemos da natureza sem qualquer direito de herança, de nada representariam, chegando às nossas posses e oferecendo alegrias sem conta?
O tamanho da nossa resistência significa o verdadeiro reconhecimento original de cada um, máquina perfeita em tudo por tudo. A saúde, as oportunidades de conhecer os mistérios da existência. O calor do Sol, a suavidade da luz da Lua, o brilho das estrelas, o ar que se respiramos, o alimento, a doçura da água, o lume dos olhos, o desenho das imagens nas telas do firmamento, somados à grandeza imensa do infinito, no tempo eterno que repete, ao sabor de momentos mágicos e pulsações intermináveis, o sorriso das crianças e a perenidade, nas outras gerações que se sucedem na exatidão da história, movimento dos corpos no ritmo e na melodia de música saborosa, na suavidade do silêncio, preservação da humanidade e suas realizações pelo decorrer de séculos persistentes, resistentes.
Para onde nos virarmos, trilhos e sonhos, na arte da Criação, representam personagens e possibilidades, circunstâncias de todas as razões de crer no melhor e acrescentar sublimidade às dádivas de Ser justo e criterioso. Por isso, por muito mais, abençoemos a chance de representar a grandeza deste outro novo dia de viver com satisfação o segredo de estar aqui.

Reginaldo Faririas no Cariri Encantado - Sonoridades!


Reginaldo Farias, artista plástico e designer gráfico dos melhores dessas bandas daqui do Cariri e que está com a exposição Grito de Uma Geração - Ecos 40 Anos depois, no CCBNB-Cariri, vai estar no Cariri Encantado desta quarta feira, dia 22, a partir das 14:10, pelas ondas sonoras da Rádio Educadora do Cariri, 1020 khz. O tema da conversa não podia ser outro que não os festivais de música que ocorreram nos anos 70 aqui no Crato e que é o grande motivo de sua vigorosa exposição. Permeando as falas a musica de Jonteilor, compositor juazeirense que também esteve presente naquele especial momento que construiu modernamente a nossa musicalidade.

ENCONTRO MARCADO

Cariri Encantado
A partir das 14 horas e dez minutos pelas ondas sonoras da Radio Educadora do Cariri, 1020 khz
Produção da OCA - Officinas de Cultura, Artes e Produtos derivados
Apres

domingo, 19 de setembro de 2010

Incêndios na floresta - Emerson Monteiro

Houve um tempo no Cariri quando irrompiam incêndios na Chapada do Araripe, que poucos meios de combate existiam, e as queimadas duravam dias, semanas a fio, devastando as matas que resistem às garras da civilização, nesta fase de melancólicas lembranças do nosso rico passado vegetal.
As preocupações cresceram, no entanto, a sensibilizar órgãos estaduais e ser instalado, já na década de 90, uma guarnição do Corpo de Bombeiros em Crato, corporação que combate o fogo na floresta, legando à Região instrumento importante dos benefícios da cidadania também noutros setores de atendimento.
Hoje, nestas fases dos meses quentes de final de ano, acontecem os incêndios, apesar de cuidados preventivos, pondo em ação as brigadas antifogo, origens atribuídas à proximidade das habitações que levam para perto das encostas ameaças de irresponsabilidade e descaso dos menos avisados no trato com a vegetação.
A propósito, em 18 de setembro de 2010 rastro de chamas cresceu nas matas das imediações do sítio Coqueiro, no município de Crato, subindo a encosta na direção da chapada, causando apreensões. Nada mais triste no Cariri destes tempos nebulosos de preservação ameaçada do que se presenciar, noite adentro, o clarão das matas, chamas avivadas pelo vento quase constante no vale. Numa fase de sol intenso no decorrer dos dias, o material orgânico de folhas e galhos secos torna-se combustível fácil às atitudes por vezes criminosas e de raras identificações. E a velocidade instantânea do fogo aumenta os riscos coletivos da destruição desse patrimônio inavaliável do microclima caririense.
Conter os focos de incêndio requer vigilância constante, sobretudo em face da ausência de conscientização dos agricultores, que prosseguem expondo a natureza ameaçada aos hábitos nocivos das coivaras, costume perverso dos antepassados. Quase sempre a origem dos focos vincula o descaso na queima das brocas.
Para que os agricultores possam desmatar e botar fogo nas brocas devem cumprir as normas legais que determinam preenchimento de formulários, sem os quais se tornam infratores da lei vigente no País.
Deste modo, ainda que existam repartições a coibir os tais abusos e combater suas nefastas consequências, resta à comunidade o exercício da participação responsável, a fim de conter o pouco das florestas que nos cabe conservar para as gerações do futuro, no Cariri.

sábado, 18 de setembro de 2010

ALGUMAS IMAGENS DA EXPO GRITO DE UMA GERAÇÃO - ECOS 40 ANOS DEPOIS!

Do fim pro começo: a gente (eu e o Abidoral) fez uma breve apresentação musical "retrô" para uma platéia muito especial.

O palco em transe!

Tenta-se entender!

Reginaldo Farias com sua fleuma sempre positiva e que move a nossa parceria.
Reginaldo tirando "uma onda"!

No rádio, a voz inconfundível de Heron Aquino rege a transmissão pelas ondas sonoras da Rádio Educadora do Cariri, 1020 krz, a noite das finalistas.

Fotografa, menina, porque aqui tudo é permitido!


Como nos tempos do Cacto (com menos espinhos)!

A sombra da Rolleiflex de Luiz José (que fotografou muitas edições dos festivais) se projeta sobre as imagens daquele tempo quando ela reinava. Na foto projetada pelo datashow aparece Abidoral recebendo uma das muitas premiações que recebeu ao longo das oito edições dos Festivais da Canção do Cariri.

A TV Verde Vale deu ampla cobertura ao evento.

Uma das fotos que gostei muito!

O Baú com fotos e documentos despertou grande curiosidade!

O Grupo Zabumbeiros Cariris permanecerá residente na Exposição como "obra de arte", uma vez que o grupo mantém uma postura semelhante a que tínhamos nos anos 70, ou seja, a opção pela simplicidade, leveza nos relacionamentos, o desejo de fraternidade e paz no mundo, etc.

O público gostou do que viu!
Todo o registro fotográfico desta postagem é de Hudson Jorge.

Tempos de ternura - Emerson Monteiro

Tempos difíceis são os tempos de ternura para todos nós, porquanto as crises impõem normas, no fim de superar seus obstáculos. Ninguém sofre em vão. O que mostra a diferença no saber sofrer é o jeito de responder às crises.
Estes tempos dagora pedem sérias atitudes em termos de carinho com que se deva conviver junto dos outros nos grupamentos da sociedade. Para onde se vira, uma demanda de atenção exige dos sentimentos da bondade.
Ruas estreitas pelo crescimento das populações das cidades; ruídos variados e agressivos com o aumento da intensidade das máquinas de som mais alto; a luta pela sobrevivência; a competição pelo poder a todo custo, sobretudo de quem demonstra mais sagacidade na área das conquistas sociais; o estudo, que pede concentração e esforço da juventude; etc.
O trânsito cresceu além da capacidade dos becos e das ruas, nas cidades, com a ligeireza dos veículos bem acima da tranquilidade construída no passado distante. A violência provocada pelas drogas, mal de proporções alarmantes que corrói as instituições de controle. E outros.
Afinal, um painel assustador em termos e proporções, portas abertas no alvorecer do famigerado terceiro milênio da humanidade.
Enquanto isso, a vida continuará, sem sombra de dúvidas, e quem for podre que se quebre, sincera e realista determinação popular. O espetáculo da existência seguirá em frente, com certeza. A raça dos homens haverá de encontrar um jeito bom de resolver suas próprias equações, o que vem acontecendo desde que se conhecem os acontecimentos.
No entanto, de dentro da casca de cada pessoa surge a condição particular de encontrar o gesto importante, nesta hora crítica. Os mestres da história vêm indicando modos civilizados para dissolver tantos bloqueios da alma humana. Oferecem novos sentimentos de paz, alegria, conformação, humildade, paciência, perseverança, justiça, amor, acima de tudo, o amor.
Valor de imensa cotação essa coisa de amor, que manifesta fraternidade e companheirismo nas estradas do viver sadio. Simples de demonstrar e difícil, porém não impossível, de praticar, nos tempos da atualidade. Descobrir, pois, os tratos afáveis da esperança por meio do amor entre as pessoas, eis a urgente proposta coletiva para que os humanos arrastem com sabedoria seus pés no lodo esquisito destes tempos de tantas e desafiadoras interrogações.

Biblioteca pólo realiza campanha do livro

A coordenação da Biblioteca Pública Municipal de Juazeiro do Norte está lançando a campanha ARRECADAÇÃO DE LIVROS PARA AS PADARIAS ESPIRITUAIS, com objetivo de conseguir abastecer as 20 bibliotecas comunitárias que serão instaladas em Juazeiro do Norte até o Centenário e outras da Região Metropolitana, que estão sendo criadas. Segundo o coordenador da Biblioteca, Franco Barbosa, a Fundação Enoch Rodrigues de Brasília já doou mais de 25 mil títulos, que chegaram nesta quarta-feira, dia 08 de setembro. “Nós precisamos de 60 mil livros nos próximo 10 meses. Por isso estamos solicitando de todas as pessoas que puderem doar livros para este grande projeto social que procurem a Biblioteca Pública Municipal Possidônio Silva Bem, e façam a doação do que for possível. Um livro, dois livros, uma caixa, duas caixas, cinco caixas; o que tiver para doar. Quem não puder vir trazer a doação, basta ligar para os telefones abaixo mencionados, que o carro da Secretaria de Cultura de Juazeiro vai até o seu endereço. Não importa o tipo do livro, aceitamos e recebendo livros didáticos e paradidáticos”, ressalta o coordenador.
Para cada biblioteca serão destinados entre dois a três mil títulos. Basta ligar para a Biblioteca Pública, deixar seu endereço e telefone que os livros serão recolhidos, especialmente quando for de uma caixa em diante.
No primeiro momento, serão inauguradas seis bibliotecas, nos seguintes bairros: Frei Damião, João Cabral, Antônio Vieira, Vila Nova, Aeroporto e no São Gonçalo, na zona rural de Juazeiro do Norte, como também abastecer e criar outras padarias espirituais em Crato, Barbalha, Antonina do Norte, Assaré, Missão Velha, Mauriti e Caririaçu.

Endereço:
Rua Santo Agostinho s/n.º, vizinho à CAGECE.
Centro - Juazeiro do Norte CE.
Tels.: 88 / 3511 1999 / 8804 0715 / 9995 6850 / 8813 4487.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

GRITO DE UMA GERAÇÃO – ECOS 40 ANOS DEPOIS (1970-2010)



TEXTO DE APRESENTAÇÃO DA EXPOSIÇÃO

Por onde você andava? No que se tornou passados 40 anos desde aquele grito adolescente que ecoou na Quadra Bi-Centenário do Crato nos anos 70? Você ainda acredita nos versos daquelas canções mensageiras de paz, fraternidade entre os homens e que veneravam a mãe terra? Ou se perdeu pelo caminho? E as flores nos cabelos, poesia no vestir, no andar, no dizer, cadê você? Quantos se tornaram menestréis?

Não tente responder. Nenhuma resposta satisfará! Apenas ouça-me, veja-me, toque-me e lembre-se de que um dia existiu um sonho e uma vontade enorme de construir um mundo bem melhor do que este em que você vive.

Luiz Carlos Salatiel e Reginaldo Farias

Como foi agradável ver um público bem jovem adentrar a nossa exposição com um olhar de admiração e curiosidade e corresponder com naturalidade a nossa proposta de interagir com todos os objetos, documentos e outros signos visuais e auditivos que ocuparam aqueles 200 m2 da galeria! Nos próximos quarenta dias, todas as quintas-feiras, faremos uma conversa - que será documentada em vídeo - com compositores e intérpretes que foram protagonistas desse inesquecível tempo.

Aqui, expressamos nossos sinceros agradecimentos a todos os que estiveram lá no momento de abertura e espero que recomendem aos amigos uma visita ao CCBNB - Cariri, 5o. andar, para a nossa exposição vai até 20 outubro.

Um grande abraço,

Luiz Carlos Salatiel e Reginaldo Farias

Vamos Correr? - José do Vale Pinheiro Feitosa

Aviso: qualquer semelhança com algum antropônimo do passado, presente ou futuro é mera coincidência. Estes fatos são uma ficção e nada tem a ver com a realidade, especialmente a brasileira.

Zuleica com roupas de jogging, serelepe para algumas voltas correndo no Parque de Exposições, em pleno das 4h30min dos galos cantantes. Passa na frente da casa de Antonio de Selma. Antonio, para surpresa geral, está com uma mangueira aguando suas plantas desidratadas. É costume esquecer, mas naquele dia, no calor dos eventos jornalísticos da noite passada, ele, o maior repórter do interior (não só do estado, é do Brasil, mas há quem diga que do mundo e eu concordo) não estica a soneca do amanhecer. Vai para suas roseiras com mangueira e tudo.

Zuleica pára e diz: vamos?

Ho..ho...ho... – é a resposta do nosso De Selma. Seu olhar de persiana arriada, como o de Luiz de Borba, é mais expressivo do que todas as reportagens que fez o ano todo.

Zuleica, continua: e a Erenice?

- É Guerra!

- ???? – isso estava estampado no rosto de Zuleica e De Selma continua:

- Tropa perdendo, no recuo é pior do que animal na armadilha, vale tudo: bala dundum, gás mostarda, o negócio é matar, esfolar, não deixar nem rastro.

- E o tribunal de Genebra? – Zuleica brinca.

- Já viu a Bósnia? Com sangue nos dentes só existe o instinto de matar. Depois vem o arrependimento quando o sangue jorrou para o lado deles. Aí vai dizer que só fez o que lhe mandaram. Foi a mídia que trouxe a munição. Foi o inimigo que lhe provocou o ódio irracional. Viu Hitler, suicidou-se para não assumir a história.

Zuleica com os olhos arregalados repete se ele não quer pôr um tênis e ir correr para espalhar o sangue.

- Vou não. Não. Não vou mesmo. Interrompe as negativas um pouco enquanto reflete algo e continua: Nem que o papa peça. Arrematou na língua do “P”.

Zuleica adora provocar De Selma para ouvir as tiradas deles e pergunta o porquê.

- Não vou porque disseram que fazer exercício rejuvenescia. Então fiz esteira com o Doutor, comprei tênis, meias apropriadas, até estes spray de tira chulé eu comprei. E sai com a esperança de que com uma semana, já tivesse rejuvenescido pelo menos um mês. Como são cinqüenta e duas por ano, num ano eu teria voltado no tempo quatro anos. Mas o quê? Qual o quê? Todo mundo era velho. Aquilo faz é envelhecer as pessoas. Não vou mais. Não me chame para corrida que eu deito.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Hospital Regional do Cariri - Benefícios para quem ?

As décadas que se estenderam de 1960 a 1980 se caracterizaram, no Brasil, por um amplo movimento privativista da Saúde. O modelo da atenção era todo centrado no Hospital, priorizando-se o tratamento ao invés da prevenção. Nestes quase trinta anos, com incentivo governamental, pulularam os serviços hospitalares em todo o país. No Cariri, inúmeros serviços surgiram neste período, nos legando uma grande oferta de leitos hospitalares. Com a queda da Ditadura Militar e o advento da Constituição de 1988, sob a orientação do Movimento da Reforma Sanitária, criou-se o SUS que buscou, nestes mais de vinte anos, em inverter o caótico modelo de atenção hospitalocêntrico. A saúde, ao menos legal e filosoficamente, passou a ser um direito do cidadão e uma obrigação do Estado, devendo ser distribuída de forma integral e equânime entre todos os brasileiros. O grande gargalo do Sistema, viu-se com o passar dos anos, à medida que se ia melhorando a gestão e a gerência, está no financiamento inadequado. O sonho , amigos, é muito maior do que a verba destinada à sua consecução e , pouco a pouco, vem se transformando num pesadelo. A grande rede hospitalar, criada anteriormente, com a inversão do Sistema para prevenção, com os programas de Agentes de Saúde e PSF, viram as verbas a eles destinadas murcharem e foram pouco a pouco fechando as portas ou se afastando para atender apenas os planos de saúde e particulares. Em todo o país, começou-se a ter um sério colapso no atendimento hospitalar para a população, com denúncias diárias de desassistência nos noticiários: Emergências lotadas, falta de plantonistas, carência de leitos em UTI. No Cariri, esta realidade não é diferente do resto do Brasil.
Assim, quando apareceu a promessa da construção de um Hospital Regional Público por aqui, todos respiraram aliviados. Finalmente teríamos uma solução à vista para o crítico atendimento de Urgência/Emergência no sul cearense ! À medida que a edificação começou celeremente, em Juazeiro do Norte, algumas preocupações começaram, novamente a nos bater às portas. Como será feito o custeio do Hospital, que já foi anunciado, pelo Secretário de Saúde anterior que orçaria , mensalmente, em torno de dez milhões de reais? Sabe-se que a Saúde trabalha com tetos financeiros fixos e limitados e que não existem verbas novas para suprir as onerosas necessidades do novo serviço. Os municípios da região terão que financiar, com seus já parcos recursos, o novo e importante hospital. Como o lençol é curto, não há como alguém não ficar com frio! Realocadas as verbas, inviabilizaremos vários serviços hospitalares credenciados que já sobrevivem a duras penas. Se fecharem as portas, os paciente serão todos direcionados ao Hospital Regional que terá uma sobrecarga terrível e padecerá, no seu nascedouro, da mesma patologia que acomete os incontáveis serviços de emergência Brasil afora ( basta ver a tragédia do IJF em Fortaleza): filas enormes, pacientes internos em corredores e macas, equipes trabalhando em regime de guerra. Para que o Hospital Regional funcione a contento, ele necessitará de uma rede hierarquizada e referenciada de qualidade e com resolutividade. Como resolver esta equação com tantas incógnitas ?
Um outro fato recente vem deixar todos profissionais de saúde da região com a pulga, literalmente, atrás , dentro e na frente da orelha. Lançado o Edital para o esperado concurso que escolherá os futuros profissionais de saúde e da administração, vimos que se entoava, novamente o “Samba do Crioulo Doido” ou , melhor, “Do Crioulo Sabido”. Primeiro, não se trata de um Concurso, mas de um mero processo seletivo. Depois, serão todos contratados, após o processo seletivo(?), sob regime de CLT, ou seja, sem nenhuma estabilidade e pior, com um salário miserável, bem abaixo , inclusive, do que se tem no mercado caririense. Eles, no Edital, oferecem em torno de R$ 375,00 líquidos , por um plantão agitadíssimo de 12 Horas. O mais preocupante, no entanto, é que o Hospital foi, literalmente, terceirizado, entregue a uma empresa privada, mas que, atualmente, rotula-se com o vistoso nome de OSCIP: Organização Social Civil de Interesse Público. No caso específico do nosso Hospital Regional ela carrega a razão Social de Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar – ISGH. O Sindicato dos Médicos tem orientado toda a categoria a não se inscrever para realização da seleção e, com certeza absoluta, o ISGH terá grandes dificuldades em fechar quadros em especialidades imprescindíveis como : Neurocirurgia, Anestesia, Cirurgia Vascular, Cardiologia.
Vivemos um quadro sui generis. O SUS sempre teve a Medicina Privada como o grande vilão da Saúde no Brasil. Era ela imputada como centralizadora das verbas da saúde e como responsável pelos desvios reiterados de recursos para enriquecimento próprio. De repente, vemos uma grande onda de privatização retornando, sob o manto aparente novo das OSCIPS. Quem se beneficia disso tudo? Os profissionais de saúde, está mais que provado, não irão para o trono. Pelo que se percebe, os usuários do SUS, também, não terão suas agruras e sofrimentos minorados. Corre-se o risco de apenas reeditar a mesma história interminável e cansativa: o couro da população sendo tirado para ser espichado, novamente , no curtume do lucro e da ganância.

J. Flávio Vieira

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

AGENDE-SE!

A nossa exposição abre amanhã. Sinta-se um convidado muito especial.
Luiz Carlos Salatiel e Reginaldo Farias

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Mãe das Dores - Emerson Monteiro

15 de setembro, mais uma festa católica de Nossa Senhora das Dores, marcada em Juazeiro do Norte, na paróquia a ela dedicada, por fortes manifestações populares em seu louvor, com a presença de algumas centenas de milhares de fiéis daqui e provenientes de tantas outras localidades nordestinas, próximas e distantes.
O culto à santa, uma das expressões místicas da mãe de Jesus, vincula-se às tradições da gente brasileira, trazido na cultura cristã da catequese portuguesa, estabelecido nesse espírito religioso próprio das crenças ibéricas.
A Virgem prefigura, pois, os sofrimentos por que passou Maria na conta das marcas fincadas pelas agonias da paixão do Filho, assistidas no tronco da cruz, lá no alto do Gólgota.
Transpostos ao viver das populações sertanejas, tais sofrimentos indicam, na alma dessas pessoas, o espinho cotidiano das intempéries físicas do mundo de injustiças sociais e carências seculares.
Padre Cícero Romão Batista, o pároco que consagrou em Juazeiro a data, nos inícios da cidade, expressa a escolha do símbolo de mensagem transcendente da resistência aos obstáculos da vida que se vive, aqui neste chão áspero, quente, sob desigualdades, pesares, na luz da esperança em dias melhores, nos ditames de valores elevados, olhos postos nos horizontes da fé.
As condições da persistência indicam, por isso, notícias que fluem da coragem de crer e sobreviver além das limitações dos planos inferiores, bem menos reais aos fiéis do que os valores imortais de um coração religioso, resignado e temente a Deus.
A cada ano, massas humanas reúnem-se nas praças, igrejas e ruas; cantam, rezam, clamam, imploram, transpiram; alegram-se e sofrem nas despedidas; energia que circula no seio das celebrações, qual sinal infinito do amor à verdade em forma de comunhão dos que sempre voltam.
Numa transfusão suprema de bons esforços para visitar a Meca nordestina, os romeiros cumprem, há mais de século, esse itinerário que traduze seus sentimentos originais, envoltos nas dificuldades comuns. Chegam em transportes de carga, ônibus, carros menores, motocicletas, bicicletas, a pé; de todas as idades e diversos níveis. Caminham confiantes, através dos pontos históricos. Reduzem naturais obstáculos. Miscigenam culturas; fazem amizades, e por vezes ficam mais tempo, deixando expressões íntimas do mistério existencial de pessoas dignas e obstinadas, na busca dos caminhos da realização definitiva, nas estradas distantes.
Portanto, cabe aos caririenses dignificar esses lugares de que são depositários dos nordestinos que retornam sinceros para revê-los, fortes símbolos de sacralidade pura, que os alimenta no recôndito da viva imagem de Maria, também nossa Mãe das Dores.

domingo, 12 de setembro de 2010

Uma solidão eletrônica - Emerson Monteiro

Se ficar parado defronte a um televisor, assistindo calado ao drama de outros personagens, resolvesse o enigma da humanidade, já haveríamos, com saldo suficiente, descoberto a resposta procurada desde que o mundo é mundo. Porém a grande aventura continua pelas vidas adentro, na mesma tentativa igual às noites frias que atravessam os guardas noturnos e seus radinhos agarrados aos programas da madrugada, catando notícias do mais profundo mistério.
Essa tal de solidão vem de muito longe, dos tempos imemoriais. Nas primeiras imagens pictóricas da civilização, na era da magia simpática, figuras foram desenhadas nos bastidores das cavernas pelos homens pré-históricos, ali parados caçadores, de olhos grudados nas cenas de animais acesos à luz dos fachos de alcatrão, querendo planejar as expedições dos dias posteriores nas ramagens da floresta.
Hoje, velhas cenas ressurgem ao toque de alguns botões das telas incandescentes de vídeos, televisões, computadores, celulares, figuras animadas que invadem a memória, repetições de caçadas silenciosas a esfinges, que persistem noutros exemplares do animal pré-histórico que somos nós.
Sentinelas avançadas da tecnologia, apalpamos paredes rústicas de prisões deste solo comum, armados de tacapes, arcos e flechas, lanças, fuzis, lanternas amoladas, pé ante pé, no roteiro das interrogações, ladeiras adiante...
Lançamos foguetes ao espaço, que retornaram vazios, espelhos de nós próprios, calendários de asas e eras, comunicação circular das carcomidas aventuras. Mergulhamos oceanos munidos de câmeras poderosas para colher lembranças redivivas de biologias e destroços de antigamente, muralhas e algumas incompreensões mantidas entre povos dissidentes, concorrentes, a peso do ouro escondido nas entranhas da Terra.
Nisso, o tropel segue arrancando raízes, levantando poeira, sacudindo pedras, faíscas, minérios, desembalada carreira na forma de letras, palavras, apegos, fracos na carne e fortes na alma, atores de epopéias e sujeitos de saudades imensas das gerações que se foram e vão.
De jeito que aquietar os ossos chega o sono, machucados egoísmos caducos dificultam a revelação. Resta, no entanto, suplicar nas orações ao Deus desconhecido da Grécia; à Deusa liberdade francesa; ao Tupã dos ameríndios; ao Deus inexistente dos budistas; no furor dos elementos, da ciência dos alquímicos. Rezar nessa montanha silenciosa de claridade intensa, oráculo dos tempos atuais. Perscrutar, com amor, as entranhas da mãe solidão, na frente deste muro de lamentações da história e seus equívocos de porões escuros. Com tais manias, os lobos, uivando para luas de cristal, vagos sufistas de ondas eletrônicas, emitem sinais de socorro, e exaustos e sós retornam melhores dos montes distantes das ilusões contrafeitas.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A felicidade não se compra - Emerson Monteiro

A verdadeira arte permanece, independente da transitoriedade das circunstâncias, dos acontecimentos que lhe deram origem e até da duração da existência física dos que a produziram. Em sentido inverso, a arte de qualidade duvidosa, além de não merecer classificação de arte, nasce com seus dias contados, por vezes virando lixo antes mesmo de ser conhecida.
Tal consideração quer falar de perto a propósito de um filme lançado em 1946, há mais de 60 anos, portanto, intitulado “A felicidade não se compra”, do diretor norte-americano Frank Capra, estrelado, dentre outros, pelo consagrado ator James Stewart, bem nos inícios de sua brilhante carreira.
A película em preto e branco, de duas horas e nove minutos, circulou o mundo e obteve das maiores consagrações do cinema em todos os tempos. Eis, então, uma obra de arte eterna, qual dissemos, isto em qualquer momento da história humana, digna de chegar aos apreciadores da beleza como bela mensagem de otimismo a toda prova, uma realização que encheu salas de exibição anos a fio em variados países.
Essa narrativa cinematográfica, oferecida ao público em uma fase de sofrimento coletivo recentemente provocado pela Segunda Guerra Mundial recém finda, aborda momentos difíceis de uma família do interior dos Estados Unidos, atingida por sérias privações sem, no entanto, desistir da esperança e da firmeza da fé.
Um pai de família bem situado na vida se depara, de uma hora para outra, com obstáculos que lhe comprometem a rotina da família, diante da incompreensão de outros e adversidades sociais avassaladoras.
O encaminhamento das situações segue numa escala de impossibilidades, e demonstra quase nenhuma chance ao êxito que, no desfecho emocional e clímax valioso, dar-se-á, em plena noite de Natal.
Enquanto ocorrem os desdobramentos do roteiro, o diretor transmite, em estilo magistral, a grandeza de alma que sustenta o ânimo dos personagens, envolvendo também os espectadores nos passos geniais da transposição para a tela do livro homônimo, escrito por Philip Van Doren Stern.
Raros instantes da criação artística obtiveram, pois, as glórias que esse trabalho de Frank Capra veio, com justiça, merecer, a significar bom motivo de os apreciadores da sétima arte buscarem conhecer a destacada produção do cinema internacional.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Feira


O matuto estava arreando o burro , madrugadinha. Acabara de botar cangalha e apertara as cilhas no último buraco do loro, quando a mulher saiu na porta, vassourão em punho, e lembrou:

--- Tonho, não esqueça de trazer minha encomenda !

O homem montou no animal, enquanto pensativo curtia a aurora sanguínea que se espraiava no horizonte, como uma sangria desatada. Preparou, calculadamente, o cigarro de palha entre os dedos e o levou à boca desdentada, com o lume aceso. Tonho esporou o burro e tentou remontar, de cabeça, o pedido que a esposa lhe fizera na noite anterior. Ia providenciar a feira em Matozinho, comprar as bugigangas da semana e sabia que uns quatorze quilômetros o afastavam da vila. A mulher lhe pedira para passar na loja de confecções de Seu Lauro Maia, defronte à praça da Matriz e pegar uma agulha de crochê. Nem sequer precisa explicar, Tonho, a moça já sabe o que é, a marca, o tamanho, tudo – lhe adiantara Judite, antes de caírem na mama , na noite anterior. Ele imaginou que se tratava de uma agulha, uma vez que a companheira era muito habilidosa com as mãos e ganhava um dinheirinho bom, desde que se metera no ramo de artesanato, arte que herdara da mãe : a velha Gerônima do Baixio de Dentro. Nos últimos meses, Tonho se dedicava com afinco na construção de um puxadinho na casa, encompridando a cozinha e levantando uma despensa para acondicionar os cacarecos. Precisara aprender artes de pedreiro quando trabalho uma época em São Paulo, ainda solteiro.

Quando chegou em Matozinho,já dia claro, fez a via sacra de sempre. Comprou os picualhos na feira e, depois, dirigiu-se à Rua do Caneco Amassado, onde encheu a cara com umas mulheres-damas sentadas no joelho. Já de tardizinha, meio melado ou melado e meio, quando resolveu tomar o caminho de volta para o Baixio, lembrou da encomenda de Judite. Chegar em casa daquele jeito, puxando fogo , com o cheiro forte de extrato barato no cangote e ainda sem levar o solicitado, era encrenca certa. Resolveu, então passar na Armarinho de Seu Lauro. Em lá chegando, achou-o um pouco diferente, com luzes coloridas na frente. De qualquer maneira, de nada desconfiou. Primeiro porque há anos não entrava na loja e, depois, a cachaça no toitiço não permitia exercer atividades de Sherlock Holmes: Elementar, Caro Watson ! Entrou porta adentro e lá, encontrou uns clientes esquisitos, caladões, fazendo seus pedidos quase sussurrando. Dirigiu-se para uma balconista novinha e solícita e mandou:

--- Ei, vim pegar a encomenda de Judite !

A moça , estranhamente, não lembrava qualquer pedido feito por uma senhora com esse nome. Dirigiu-se às colegas, mas nenhuma parecia saber do estranho embrulho da esposa. A balconista, educadamente, lhe explicou o impasse e o acalmou:

--- Ninguém lembra da encomenda da D. Judite, mas vamos ver se a gente tenta descobrir...Para que servia mesmo , o senhor lembra, seu, seu...

--- Tonho ! Bem, ela pegava a bichinha, deitava e passa o dia todo enfiando e desenfiando...

--- Hummmm ! Acho que já sei do que se trata , seu Tonho! Me diga uma coisa, era grande, média ou pequena ?

--- Acho que é grande que ela usa e com a ponta meio torta, como um anzol...

---- Certo, certo... Bem grande, não vai ter problema, agora torta... e não tem perigo de enganchar, não ? Me diga uma coisa, Seu Tonho e o Senhor, não quer levar nada? O que fica fazendo enquanto D. Judite está enfiando, desenfiando ?

--- Ah, minha senhora, nem se preocupe, eu tou lá no puxado, acabando a minha mão... É um duro danado... De tardizinha tou de perna bamba...

--- Olhe , seu Tonho, admiro o vigor de vocês, mas não é muito bom exagerar não. Vão devagar com o andor... Vocês ficar tisgos... Vocês nunca trabalham junto não, seu Tonho, se mal pergunto ?

--- Não, ela só gosta de trabalhar sozinha ou com Isaura Pandora, uma amiga dela. E ainda apuram um dinheiro danado... trabalham também sobre encomenda, viu? E eu só gosto de plantar com Isacc que mora lá perto de nós.

--- Bem, seu Tonho, vou pegar a encomenda de D. Judite, tenho certeza que ela vai adorar.

A mocinha volta com um pacote imenso e, quando tira o papel para mostrar a Tonho, ele quase cai de costas.

--- Minha senhora, pelo amor de Deus, que diabo de agulha de crochê é essa? Isso é para costurar empanada de circo? Lona de Scania truncada? Parece uma rola, meu senhor! Chame seu Lauro que quero falar com ele!

--- Seu Tonho, o Armarinho de Seu Lauro é do outro lado da praça, se mudou já faz uns seis meses. Isso aqui, é um pênis mesmo pois agora aqui funciona um Sex Shop.

Tonho saiu cambaleando: mais pela visão inesperada que pelos eflúvios etílicos. Meu Deus, o que ainda falta comerciar neste mundão sem cancela? Pegou o rumo de casa. No meio da estrada, parou para uma tirar água do joelho. Quando terminou, deu as três balançadinhas de praxe e, antes de enfiar a bicha de volta, de braguilha adentro, contemplou-a murcha e contrita pelo frio de julho e sem disfarçar o complexo de inferioridade, lascou:

--- Agulha de crochê... Entra prá casa , alfinete véio dos seiscentos...


J. Flávio Vieira

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

CARIRIANAS


DA IBIAPABA

Por Zé Nilton*

Sabe chilito, aquela coisinha feito binga de cabrito, amarelinha, que faz a festa da criançada pobre do Nordeste? Pouco se encontra à venda em Viçosa do Ceará. Estamos na terra da peta, uma iguaria feita de polvilho, um filhós pequeno, crocante, muito gostoso e que só faz bem. Nas ruazinhas das partes altas da velha cidade, uma casa e outra não, do lado direito da rua, e em todas as casas da esquerda, o fabrico doméstico de peta não chega pra quem quer. Viçosa do Ceará é pródiga em peta, pródiga em cachaça e igualmente pródiga em história.

Olha só: a maior concentração de índios da capitania de Pernambuco resultou no maior aldeamento indígena do Nordeste, aqui na Serra da Ibiapaba. Todos os olhares da catequese por via lusitana acorreu para a Serra Grande a partir da segunda metade do século XVII . Em 1700 se instala seu primeiro Aldeamento e Missão dos Índios Tabajara, em Viçosa da Ibiapaba.

Destas terras altas se narram episódios e figuras marcantes da trajetória da colonização portuguesa no Ceará e no Nordeste. Desde a saga do primeiro emissário jesuíta enviado de Pernambuco para aplacar a ira da indiada na Ibiapaba, logo após a beligerante passagem de Pero Coelho, e que resolvendo seguir até o Maranhão, o padre Francisco Pinto, terminou por ser trucidado pelos índios da nação Trarairiús, salvando-se seu coadjutor, o padre Luiz Filgueira.

Padre Pinto tornou-se o santo de todas as tribos do médio e baixo Jaguaribe e zona norte do Siará Grande. Tem também a passagem do intelectual, exímio orador e temido pelas cortes da época, o padre Antonio Vieira. Sem falar do imponente índio tabajara, na defesa documental de Tristão de Alencar Araripe(1), o assim batizado Antonio Felipe Camarão, aliás, Dom Antonio Felpe Camarão, título inédito dispensado a um índio,outorgado pelo Rei Felipe IV, por sua luta contra os holandeses desde o Ceará até Pernambuco.

A Ibiapaba é lembrada igualmente como paisagem e lugar de contendas portuguesas, indígenas e francesas na famosa obra do capuchinho Claude D´Abbeville, escrita em França no ano de 1614, logo após sua brava permanência de quatro meses em terras maranhenses.

Viera junto a uma companhia francesa a mando do rei Luiz XIII cujo fito era instalar a França Equinocial após a malograda tentativa da França Antártica, no Rio de Janeiro. E como missão católica, tirar os povos indígenas dos confins do inferno e trazê-los à purificação cristã.

Sua descrição sobre a passagem pela enseada de Camurim, olhando a Serra Grande, bem distante, é de uma sutileza própria da escrita dos viajantes europeus.

Sem dúvida uma leitura pra lá de prazerosa sobre uma faceta político-religiosa-militar empreendida por uma França ávida em implantar colônias no novo mundo.

Eurocentrismo, etnocentrismo, visão de mundo e forte inclinação apologética à parte, Claude d´Abbeville narra em detalhes a bravura da empresa francesa e todas as conquistas e todas as ações positivas e negativas em favor da salvação das almas selváticas e do domínio francês no Maranhão e terras circunvizinhas. Narra a história, a geografia, a cosmologia, a cosmogonia e a antropologia da grande nação Tupinambá, habitante do litoral brasileiro e sua concentração na Ilha do Maranhão.

Dei-me a mim um presente nos meus completos e bem vividos sessenta anos, a ansiada leitura da “ História da Missão dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas”, do padre d´Abbeville, reprodução fac-similar da edição publicada pela Livraria Martins Editora, em 1945; tradução de Sérgio Milliet.

Dela e de outras obras como a de Jean de Lery, de Frei Martinho de Nantes, de Ives d`Evreux, de Vicencio Mamiani, de André de Thevet e de tantos viajantes e missionários que descreveram seus encontros com o outro, os índios do Brasil, sejam do litoral sejam dos sertões, tenho a lamentar a falta desses escritos sobre os nossos Cariri da parte do Ceará.

É imergir num quebra cabeça a tarefa de historicizar de seu ponto de vista a saga guerreira e duas vezes vencidas a passagem desses povos pelos solos que pisamos.

Só para dizer, nunca me convenceu a infame característica Cariri difundida pelo seu mais ferrenho oponente o Tupi, e alimentada e reproduzida por quase todos os escritores indigenistas como “calados, desconfiados e macambúzios”. Um povo que sustentou uma luta inglória por tanto tempo, como ser isto? Bom, mas aí é outra história.

Escrevo estas linhas da capital da Ibiapaba, Tianguá, terra de caboclos trabalhadores, a perfeita mistura dos Tabajara com europeus.

(*) Antropólogo. Professor do Departamento de Ciências Sociais da URCA. jn-figueiredo@hotmail.com
(1)História da Província do Ceará, dos tempos primitivos até 1850. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2002.

domingo, 5 de setembro de 2010

Padarias Espirituais no Cariri - Emerson Monteiro

Recebemos do jornalista e escritor Franco Barbosa um e-mail informando que, nesta segunda-feira (06 de setembro de 2010), chegarão ao Cariri 12 toneladas de livros encaminhados de Brasília por Elmano Pinheiro Rodrigues. Esse material se destina às bibliotecas comunitárias de Juazeiro do Norte, aos assentamentos do Crato e às bibliotecas comunitárias de Mauriti, Barbalha, Araripe e Antonina do Norte CE, dando seguimento ao projeto das Padarias Espirituais iniciado por Elmano Rodrigues em todo o Brasil.
A proposta de Elmano é incentivar a preservação da memória das personalidades locais nas comunidades onde elas viveram e prestaram serviço, as quais, com o passar do tempo, ficariam esquecidas na memória social, adotando seus nomes para as novas bibliotecas fundadas por ele. Um dos exemplos que apresenta: Abelardo Arrais, líder no distrito de Quincuncá, em Farias Brito, o qual, para resgatar memória e obra do líder, realizou na localidade a instalação do que considerar uma padaria espiritual, referência ao movimento literário cearense do final do século XIX, em Fortaleza, capitaneado por vários intelectuais, dentre os quais o escritor Antônio Sales. Tinham preocupação idêntica, de fomentar o gosto pela leitura no seio da grande população, através de constantes atividades de divulgação das obras literárias.
No seu ofício profissional, Elmano Rodrigues se movimenta com desenvoltura junto às editoras e autoridades, tanto na Capital Federal quanto no Sudeste do Brasil, reunindo por doação livros e conseguindo o transporte destes aos lugares mais distantes que sejam do território brasileiro.
Os livros são adquiridos junto a ministérios, editoras, universidades e secretarias, sobretudo no Distrito Federal.
Para iniciar uma padaria espiritual, ele oferece a primeira cota de 500 livros, aos quais depois virá reunir novas publicações, a depender do interesse de quem se dispuser a levar em frente o trabalho inicial.

sábado, 4 de setembro de 2010

Maestro Azul

Maestro azul é muito mais do que o nome de um dos mais importantes tipos populares do Crato. É um título nobiliárquico, como devem ser os nomes dos verdadeiros mestres da música, a exemplo de Telonius Monk e B.B. King.

Maestro Azul pintou o seu mundo com todas as cores, do preto, cor de sua pele, ao branco, da farda de gala da banda Municipal do Crato, do qual foi um dos mais expressivos regentes. Não era apenas um condutor, mas também compositor. Pena que pouco ficou registrado de sua obra.

Natural de Jardim, terra de músicos, como Zé Menezes e Manel D’Jadim, Maestro Azul, no entanto, encarnou mais do que ninguém a mais pura e legítima cratensidade.

Lembro dele em várias ocasiões: como maestro da Banda de Música do SESI Crato, em inúmeras e inesquecíveis retretas ou solenidades, à frente da Banda Municipal do Crato, ou simplesmente no cotidiano gerenciamento do seu bar, localizado na Praça Juarez Távora, em frente à Igreja de São Vicente, no centro do Crato.

O poeta Geraldo Urano contou-me um episódio inusitado que envolveu o Maestro Azul e o laureado instrumentista carioca Paulo Moura. Este passava, anônima e descompromissadamente, um final de semana no Crato, por volta do início da década de 1980. Geraldo fazia-lhe companhia, ciceroneando-lhe pelos recantos do município. Foram tomar banho na Nascente e depois foram beber umas cachaças no bar do Maestro Azul. Lá os dois músicos fizeram uma jam session, Paulo Moura no clarinete e Maestro Azul no saxofone. Rolou um impagável repertório de chorinhos e gafieiras.

P.S.: Esta croniqueta já foi publicada em outros blogues algum tempo atrás. Republico agora no Cariri Encantado por conta e força do programa homônímo, da Rádio Educadora do Cariri AM, apresentado por Luiz Carlos Salatiel, veiculado nesta sexta, 3, enfocando este mestre da arte caririzeira. Esta é minha homenagem ao Mestre-Maestro Azul.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Palhaço por palhaço



"Através do humor nós vemos
no que parece racional, o irracional;
no que parece importante, o insignificante.
Ele também desperta o nosso sentido de sobrevivência
e preserva a nossa saúde mental."
Chaplin

O que vem acontecendo, ultimamente, com os humoristas brasileiros, amigos, não tem nenhuma graça. Desde 1º. de Julho, com base na Lei Eleitoral, encontram-se proibidos "trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo" que ridicularize candidatos, partidos ou coligações. Pela lei, piadas e paródias ficaram vedadas desde então. Os humoristas desencadearam vários atos públicos de protesto, uma vez que tal determinação parece se consubstanciar em Censura e ainda tramita no STF, já com parecer prévio do Relator, o Ministro Carlos Ayres de Britto, uma medida suspensiva desta parte específica e esdrúxula da Legislação Eleitoral. Não bastasse isto, esta semana, em entrevista, o atual Ministro da Cultura , Juca Ferreira taxou o Candidato a Deputado Federal por São Paulo, o comediante “Tiririca” de estar praticando um desserviço à Democracia, “um deboche”, por conta do seu slogan de campanha : “Vote no Tiririca, pior que tá num fica!”
Vamos conversar um pouco sobre estes dois episódios tão emblemáticos da vida deste país. Quem se detiver alguns minutos na Propaganda Eleitoral Gratuita, facilmente há de compreender as profundas razões da implicância dos homens públicos , para com os programas humorísticos e é sempre bom lembrar que são os políticos que legislam. No fundo, parece ser uma questão envolvendo fatia de mercado: os políticos temem a concorrência.É bonito ver a fluidez democrática nas mais variadas propostas: legalização/Não legalização das drogas; Liberação/proibição do Casamento Gay e tantas , tantas outras. As caras, porém, que se apresentam no vídeo, são, em sua maioria, hilárias, despreparadas para representarem uma minúscula Associação de Bairros. Os que posam, por outro lado, de bacanas, falantes, letrados, carregam muitos uma Ficha mais suja que poleiro de pato. Têm uma Folha Corrida que envergonharia o pior marginal recolhido ao IPPO. Proibir o trabalho dos humoristas não é apenas um ato que me parece francamente inconstitucional, degradante, homicida do livre pensamento; é este sim, caro Ministro, um desserviço supremo à Democracia. Os fichas sujas tentam , mais uma vez, jogar a sujeira pra debaixo do tapete.Existem poucas coisas neste mundo tão sérias como o humor. Com um agravante : a medida é totalmente inócua. A piada faz parte umbilical do folclore político, talvez até para ajudar a suportar as tragédias daí advindas, assim como o humor negro brota rapidamente de todos os velórios. Existe um humorista em cada esquina deste país, em cada mesa de bar, em cada rodinha de praia. Quem os vai fiscalizar? Ressuscitaremos os antigos fiscais do Sarney? Imagino que no próximo carnaval não sejam permitidas máscaras de Obama, de Lula e fantasias de Napoleão Bonaparte. Proibidas, as anedotas ficam muito mais contagiosas e adquirem um tempero todo especial. Os verdadeiros humoristas deste país, são vocês caros políticos, para a Lei ser efetiva, será necessário cancelar definitivamente o horário eleitoral gratuito, o melhor programa humorístico da televisão brasileira.
Acredito, também, que nosso Ministro da Cultura foi infeliz no seu pronunciamento. “Tiririca” , com a lucidez ingênua dos palhaços, transmite uma clara verdade no seu slogan. Primeiro, exerce um direito sagrado, o de se candidatar como qualquer outro brasileiro. Durante a propaganda eleitoral, ele pergunta se o eleitor sabe o que faz um deputado federal e conclui: “pois eu também não sei, me elejam que eu vou lá, descubro e conto depois para vocês” . Basta observar as propostas dos incontáveis candidatos para perceber que a maioria não tem a menor idéia das funções que irão exercer. Prometem coisas absurdas como : aumento do salário, construção de hospitais, casas populares... como se fossem assumir algum cargo executivo e não legislativo.A tiririca é uma planta daninha não muito diferente da maior parte dos integrantes do Congresso Nacional. Com o nosso Tiririca, tenho certeza que pior do que está não fica. E ainda temos a vantagem de colocar em Brasília um palhaço verdadeiro. Palhaço por palhaço, prefira o verdadeiro e não o falso!


J. Flávio Vieira